É bem verdade que abro mão de muita coisa por ti, tão somente porque optei te agradar, e não porque me obrigas. Não escondo de ninguém a insatisfação em não te ter por perto, não disfarço a careta de desgosto quando as circunstâncias me afastam da tua presença. Deixo de ver meus filmes preferidos e passo a assistir os teus. Deixo de usar meu shampoo para usar o que quer que tu tenhas no banheiro. Deixo minha mania de limpeza de lado para que não se zangues. Deixo de passar meus perfumes preferidos só para ouvir dizeres que o cheiro da minha pele é o melhor do mundo. Abro mão dos meus esmaltes vermelhos e minhas maquiagens, abro mão destes simples detalhes que fazem toda a diferença. Abriria mão de inúmeras outras coisas, diante de apenas um pedido teu, dos teus lábios ou dos teus olhos. Tu não gostas, bem sei, mas a verdade é que abriria mão da minha própria felicidade, só para que tivesses a tua.
E faço todas essas coisas porque optei por fazê-las. Abro mão de todas as particularidades e me desfaço para que tu me refaças, a cada dia, porque é deste jeito que sei viver. Enquanto tu me recompensares com teus sorrisos, teus olhos brilhantes e teus carinhos, continuarei trocando minhas mil vidas por aquela que mais te agrada. Enquanto nossos sentimentos forem pares, enquanto houver palavras apaixonadas, enquanto a conexão entre nós for maior do que os pequenos atritos que minam os relacionamentos, então continuarei a me metamorfosear por ti.
Apenas enquanto durarem os olhares verdadeiros e a vontade de permanecer. Só por quanto tempo durar o amor que ultrapassa barreiras. Só enquanto sentir tua reciprocidade, tua vontade de me fazer feliz, tua flexibilidade ante os meus apelos. Tua vontade de, junto comigo, superar as adversidades. Enquanto eu me sentir tua, serei tua. Quando nada disso fizer sentido algum, quando as palavras causarem estranheza aos ouvidos e aperto ao coração, então tratarei de ser novamente (e somente) minha. Teus gostos irão embora juntamente com as tuas roupas, tuas recordações e tuas fotografias. Meu prazer por sentir tua respiração próxima, tranquila ou agitada, tratará de ser permutada pela simples e nostálgica saudade dos dias em que permanecíamos entrelaçados, apenas sentindo o tempo passar e nos restaurar. Obviamente te levarei no peito, mas a completa admiração pela tua pessoa se transformará em aversão a qualquer memória tua. A vontade arrebatadora de te ter por perto e de tocar em ti terá de ser substituída pela certeza de uma vida que poderia ter sido, mas não foi.
Não haverá arrependimento, apenas a boa lembrança do tempo em que me doava sem medo e a dolorosa espera pelo dia em que, finalmente, sentirei que sou minha outra vez.
